Image Map

terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Cap 9-3 "A Princesa Roubada"


Parte 3

“Você é muito rude”, ela disse a ele. “Como saberia o que penso?”.
“Eu disse a você, seu rosto mostra os seus pensamentos”.
“Tolice!”, ela replicou. “Ninguém nunca tinha dito nada do tipo”.
“Eu sei exatamente o que você está pensando”, ele murmurou.
As sobrancelhas dela formaram um arco cético. “Oh? Diga, então”.
Ele se debruçou adiante, bastante perto para provocar a traquilidade dela, e ela foi um pouco para trás cautelosamente. Ele observou o rosto dela. Então sorriu amplamente. “Agora mesmo você está desejando que eu caia em algum rio muito frio, com água muito barrenta—e com sanguessugas”.
Ela deu a ele um olhar frio. “E com muita ervas daninhas”. Ela olhou de relance em torno da sala à procura de um novo tópico para conversar. Algo inócuo e enfadonho. Sem nada escondido por baixo. Havia várias pinturas; algumas paisagens, muito escuras e sombrias, e alguns retratos, anos obsoletos.
Um retrato que a intrigou estava pendurado sobre o consolo da lareira. Era de uma mulher de meia idade, com traços firmes e aparência severa. Olhos azuis claros encaravam os ocupantes da sala, ao longo de um grande nariz bicudo.
Pobre mulher, sofrer com um nariz assim. Fez com que ela se sentisse agradecida pelo nariz achatado e comum que possuía.
“Minha tia-avó Gert”, ele disse, fazendo-a saltar.
“Ela criou a mim e a Harry e me deixou esta casa”. Ele ficou de pé. “Agora, já que você não vai me deixar te paquerar, pouparei meu orgulho e irei oferecer uma partida ao seu filho. Ele parece um pouco chateado e há outro tabuleiro de xadrez lá no armário. Você se importaria de se juntar a nós?”.
“Não, obrigada, tenho minha costura para fazer”, ela disse educadamente. Ela observou-o cruzar o quarto e convidar o filho dela para jogar com ele. Ele poderia ter chamado um outro adulto para jogar.
Ela olhou de relance para o retrato da mulher de aparência severa sobre a lareira e se perguntou como uma tia-avó de idade avançada tinha criado os dois filhos mais jovens de um conde, e não os dois mais velhos. E por que Harry era um meio-irmão. E uma criança selvagem.

Na manhã seguinte após o café da manhã, cumprindo com sua palavra, Arthur tinha levado Jim e Nicky para pescar. Foi um café da manhã simples: quatro criadas tinham chegado e começado a trabalhar naquela manhã e a Sra. Barrow estava ocupada dirigindo um frenesi jovial de serviço doméstico.
Lua e Mel tinham se abrigado no quarto octogonal, levando algo para costurar. Nicky precisava de novas camisas e Lua precisava de mais roupa de baixo, então as duas mulheres sentaram para costurar no quarto morno e ensolarado para tentarem colocar em dia os anos em que tinham ficado separadas, conversando e fazendo planos.
Por volta das onze horas, o Sr. Suede colocou a cabeça pela fresta da porta. “Senhorita Melanie, eu estava me perguntando se… desejo ir até a Fazenda Rose Bay para ver aquele garanhão e já que o seu chalé fica no caminho, pensei que talvez você pudesse querer parar pelo caminho e ver se consegue achar o seu gato. Contanto que você não se importe de esperar enquanto eu inspecionar o garanhão”.
“Importar com a espera? Realmente não”. Mel deixou de lado a camisa para Nicky que estava costurando e ficou de pé. “Obrigada, Sr. Suede, é muita consideração de sua parte. Estava preocupada com meu gatinho Kitty. Ele é uma criatura tão doce, pequena e teve uma vida tão dura”. Ela girou para Lua. “Você não se importa, não é, Lua?”.
Lua sorriu. “Não, claro que não, Mel querida. Vá. Espero que você ache seu gatinho Kitty”.
Mel saiu apressada, deixando Lua só.
Ela continuou sua costura. Para dizer a verdade, estava apreciando bastante a paz—nos últimos dezoito dias em que estava viajado, mas raramente tinha parando, e ainda assim o fizera apenas para dormir. Era maravilhoso apenas poder se sentar e não ter que se preocupar em ficar alerta; seu paradeiro era desconhecido e Nicky estava seguro.
Ele realmente estava seguro com Arthur, ela sabia. Ele era um homem no qual ela podia confiar—em termos de proteção, pelo menos. Ela teve sorte de ficar sob a proteção dele como tinha acontecido, recebendo esta pausa antes de continuar a jornada.
Mas isto era o máximo que podia ser—uma pausa. Ela não tinha passado por todas as dificuldades para sair de um tipo da prisão para apenas trocá-la por outra. E seria uma prisão, ela podia ver os sinais de advertência. Segura e confortável, talvez, mas uma prisão, do mesmo modo. Uma prisão que ela mesma estava criando.
Ela tinha a tendência de querer colocar a cabeça dentro da corda pendurada.
Tinha sido a primeira real lição de seu casamento. Mesmo após tantos anos, ainda tinha o poder de enchê-la com humilhação ao se lembrar. Que papel de tola ela tinha feito com Rupert. Uma tola pública.
Ela pensou que já tinha se esquecido de tudo aquilo, mas aquele beijo no quarto octogonal, tão surpreendente, que perturbou sua mente, sublime e terrível tinha emitido sinais de advertência com três metros de altura.
Nunca mais ela colocaria sua felicidade nas mãos de um homem. Ela era mais velha e mais sábia agora.
Ela partiria. Protegeria a Nicky e a si mesma.
Ela se aproveitou do isolamento para soltar algumas das joias que tinha costurado na anágua—não as mais valiosas dela, eram apenas um alfinete de rubi e uns poucos brincos de pérola—artigos pequenos e facilmente vendáveis que dariam a ela dinheiro vivo para viajar.
A questão era se ela deveria ir a algum outro local rural e viver lá tranquilamente, ou se deveria desaparecer em Londres.
Você não pode continuar fugindo. O Conde Anton deve ser parado.
Ele estava certo, ela sabia, mas como ela poderia parar o Conde Anton? A única coisa que o pararia seria a morte dele, e ela não estava certa de que conseguiria matar alguém. Ela tentou listar suas opções, mas continuava voltando a apenas duas: fugir ou matar o Conde Anton… fugir ou matar o Conde Anton.
Se Nicky pudesse abdicar… mas ele não podia, não até ter dezoito anos. E ela não queria que ele fizesse isso, de qualquer maneira. Ser o príncipe de Zindaria era seu direito de nascimento.
Planos e possibilidades rodavam por seu cérebro. O sol fluía através da janela octogonal. O calor era divino. Ela dobrou a costura no colo e fechou os olhos, apenas para apreciá-lo por um momento.

“Mamãe, eu me diverti muito!”, Nicky entrou repentinamente na sala tagarelando ininterruptamente. “Nós pegamos muitos peixe, e nós fizemos um fogo na praia, cozinhamos e comemos eles—com os nossos dedos, mamãe! E eram os peixes mais deliciosos que eu já comi na vida. E cavamos pequenas conchas da areia e as fervemos e comemos, também. E nós encontramos dois outros meninos que Jim conhece e eles são ótimos companheiros e caímos e ficamos molhados, mas estou seco agora porque um dos outros meninos vive num estranho e pequeno chalé próximo à praia e eles me emprestaram algumas roupas enquanto as minhas ficavam secas. Oh, mamãe, você devia ter estado lá!”.
Quando ele parou para respirar, Lua não conseguia parar de rir. “E você pensou em guardar algum peixe para mim, meu valente pescador?”.
“Sim, claro, mamãe. Eu prometi que iria”.
“Claro que você fez, querido. Obrigada”. Ela olhou para o homem alto que estava parado na entrada, assistindo-os com um sorriso lânguido.
“Obrigada, Sr. Aguiar”. Ela sorriu para ele. “Eu não via Nicky feliz assim… oh, nunca tinha visto. Faz tudo valer a pena”.
“Mesmo o atraso que eu te forcei a fazer?”.
“Sim, mesmo isto, entretanto…”, ela esquadrinhou o corpo longo e magro dele. “Suponho que você caiu, também, não é?”, ela perguntou esperançosamente.
Ele riu. “Não”.
“Nenhum dos dedos do pé foi beliscado por uma lagosta ou um caranguejo?”.
“Não”.
Ela deu um suspiro falso. “Oh bem, não se pode ter tudo, suponho. Devemos ficar contentes com o divertimento de Nicky”. Ela tentou não sorrir, mas ele brotou inesperadamente de qualquer maneira.
Ela correu os dedos afetuosamente pelo cabelo de Nicky. E viu algo. Ela franziu o cenho, e olhou mais perto. “O que? É um, é um—”
“Uma lêndea. Um piolho”, Arthur disse, examinando por sobre o ombro dela. “De fato, vários piolhos. Vê, ali tem outro”.
“Piolhos?”, ela exclamou. “Meu filho tem piolhos?”
Ele pareceu achar o horror dela divertindo. “Não se preocupe, eles não comem muito”.
Ela o olhou fixamente com indignação muda.
“Você não é muito boa com coisas que rastejam e que tem patas pequenas, não é?”, ele comentou. “Sanguessugas, piolhos…”
“Não, eu não sou!”, ela falou de repente, aborrecida pela diversão dele. Piolhos eram coisas repugnantes, sujas. O filho dela nunca na vida tinha sido exposto a tais criaturas. “Nicky, como que você—”, ela cessou bruscamente. Teria acontecido quando ele usara a roupa do outro menino. Ela olhou para Arthur. “Como pôde deixar isso acontecer?”.
Ele encolheu os ombros indiferentemente. “As lêndeas não o matarão. Você mesma disse que ele teve um dia esplêndido. Além disso, poderá ser bom para ele”.
“Bom para ele?”, ela estremeceu.
“Nicky um dia será o príncipe herdeiro de Zindaria. Diga-me, quem será melhor regente—um homem que não tem nenhuma ideia da vida cotidiana e das misérias do povo comum, ou um homem que quando menino conviveu com os filhos dos pobres?”.
Ela fechou os olhos. “Certo, suponho que você tenha um bom argumento”.
“Então não se preocupe com piolhos, pulgas, arranhões ou lama—”
Ela abriu os olhos. “Pulgas?”, ela disse vagamente.
Os olhos azuis dele cintilaram. “Com certeza ele terá pulgas. A Sra. Barrow está bastante acostumada a lidar com meninos e com o que eles podem trazer para casa. Ela vai rapidamente levar Nicky e Jim para um banho, examiná-los cuidadosamente com um bom pente fino e esfregar um creme especial contra lêndea no cabelo dele—que é fedorento, mas eficaz, prometo. E ela ferverá as roupas no tacho de cobre”.
“Como você sabe tanto sobre…”, ela olhou de relance para os piolhos no cabelo do filho e estremeceu.
“Eu tive piolhos antes. É um incômodo constante no exército—sim, até os oficiais têm. E quando eu era menino Harry e eu tivemos nossa parte de pragas em nós também. Tivemos os mesmos problemas que os rapazes locais, também”.
Lua deu ao filho um pequeno empurrão. “Vá, Nicky, vá e mostre a Sra. Barrow o que mais que você pegou hoje além dos peixes”.
Nicky ficou de pé. “Eu tive sanguessugas e agora tenho piolhos!”, ele exclamou.
Ambos, Lua e Arthur riram do evidente orgulho que ele tinha na realização.
“Realmente, Nicky, a experiência te fará um príncipe melhor, algum dia”, Arthur disse, arrepiando o cabelo dele enquanto ele passava.
Lua o assistiu e sorriu.
“Estou contente por você ter aceitado”, ele disse depois que Nicky partiu.
“Longe de mim impedir o desenvolvimento do futuro príncipe”. Ela olhou de relance para Arthur. “Eu não suponho que você tenha pegado aquilo, também”.
“Não. Você está sem sorte hoje”.

“Não estou tão certa”, ela disse, tentando não sorrir. “Você arrepiou o cabelo do meu filho agora há pouco. E pelos últimos minutos você está se coçando. Talvez seja melhor que você veja a Sra. Barrow, também”.


Nenhum comentário:

Postar um comentário

Comentem, gosto dos comentários!Sem xingamentos okay?