Parte 3
Ele puxou uma cadeira no canto para ela e se sentou.
“Eu pensei que você iria comer na cozinha”.
“E te deixar aqui comendo sozinha?”, ele agitou a cabeça. “Além disso, nos dará
a chance de nos conhecermos melhor”. Ele deu a ela um olhar que trouxe de volta
todas as sensações que ela tinha experimentado nos estábulos.
“Eu não desejo te conhecer melhor”. Percebendo como isso tinha soado rude,
ela acrescentou, “devo partir assim que possível”.
“Sério? Vamos discutir isto mais tarde. Coma seu café da manhã enquanto está
quente”, ele recomendou.
Ela fez uma prece silenciosa em agradecimento pela comida e começou a
comer, muito consciente dele sentado a apenas alguns poucos metros dela,
aqueles olhos azuis, muito azuis que pareciam estar o tempo todo sobre ela todas
as vezes que ela olhava rapidamente na direção dele. Ela sempre tinha sido tímida
em comer na frente dos outros.
A voz do pai ecoou na cabeça dela, como fazia na maioria das vezes em que
ela comia. Uma dama não come como um
cavalo, Lua, em vez disso, escolhe sua comida delicadamente, como um passarinho.
Com olhar crítico do pai sobre ela, Lua nunca tinha apreciado uma refeição.
Não importava o quão delicadamente ela escolhesse a comida, não importava com
que frequência ela saísse da mesa faminta, o olhar perfurante do pai estava sobre
ela, e ela sempre se sentia como um
cavalo.
Ela cortou para si uma lasca de bacon, apenas uma minúscula e delicada fatia,
então pausou. Ela pensou naquela cena no estábulo, não quando ele—ela deu uma
olhada através da mesa — a tinha beijado. Mas o que tinha acontecido logo antes
disto. Quando ela tinha perdido a calma com ele.
O pai teria dito que, uma princesa
não ergue a voz, Lua. Uma princesa não é a esposa de um pescador. Uma princesa
permanece serena e digna o tempo todo.
Lua tinha perdido a paciência. Tinha erguido a voz. E podia imaginar que
tinha até gritado como uma mulher de pescador—ela certamente tinha cutucado o dedo
no peito dele como uma. Ela não tinha sido nada serena, nem digna.
E tinha sido maravilhoso se sentir assim.
Lua olhou para a pequena porção de bacon em seu garfo.
Todas as formas de porco são execrações
para qualquer mulher de bom gosto. A voz de Rupert ecoou
na cabeça dela.
“Algo errado com o seu bacon?”, uma voz profunda interrompeu os pensamentos
dela. “O meu está delicioso”.
Lua piscou para o homem sentando em frente a ela. “Não. Não”, ela disse
pensativamente. “Não há nada de errado com ele”. Ela enfiou o garfo na pilha de
bacon e cortou para si uma boa quantidade. Ela mastigou lentamente, saboreando.
Divino.
Ela podia sentir o olhar azul inquietante dele e decidiu que não daria a
mínima para isso. Ela comeu outro pedaço de bacon e mais outro. Ela comeu um
pouco dos ovos mexidos. Estavam macios, suaves e deliciosos. Ela comeu um pouco
mais de bacon.
Ele sorriu amplamente para ela. “Disse que o bacon estava bom, não disse? Não
posso te dizer quanta falta senti do cheiro de um bom bacon defumado em casa. Não existe nada
como isto”.
Ela olhou para o prato abaixo e piscou. Ela tinha comido o pequeno monte inteiro
de bacon. E os ovos. E ela se sentia maravilhosa. E tinha estado tão faminta.
“Gosto de ver uma mulher comer bem, com apetite saudável”.
Ela deu a ele um olhar estreito, não estava certa de como deveria tomar as
palavras dele. Ele estava provavelmente insinuando que ela tinha comido como um
cavalo, mas Lua não se importava. Não era da conta dele—além disso, ele parecia
gostar de cavalos.
Não que ela se importasse mais com o que alguém pensasse dela. Ela não
devia mais obediência a ninguém. Ela estava livre, disse a si mesma incrédula.
Livre para dizer o que quisesse, fazer o que quisesse, comer o que quisesse.
Era uma sensação eufórica.
A porta se abriu e Jim entrou com uma pilha de torradas, seguido por Nicky
carregando mel, marmelada e manteiga.
“Devo passar manteiga na sua torrada enquanto ainda está quente?”, Arthur
perguntou quando os dois meninos saíram da sala.
“Não, obrigada”. Ela tomou um gole de chá: fraco, preto e não adoçado.
Ele espalhou manteiga na torrada com uma mão generosa. “Marmelada? Da Sra. Barrow
é excelente”.
Lua olhou para a torrada, derretendo a manteiga. Ela tinha se dado ao
capricho de comer bacon e ovos. Comer como um cavalo era uma coisa: comer com uma
porca era outra bem diferente. “Não, obrigada”.
“Mel, então. Boa escolha. Você vai achar interessante e delicioso também. Nossas
abelhas buscam o néctar entre as plantas do litoral e isso dá ao mel um sabor
sem igual”. Ele deixou pingar mel em uma fatia de torrada e a passou para ela.
Ela não deveria. Ela realmente não deveria.
Fraca, aceitou. Ela mordeu a torrada morna, crocante e fechou os olhos em êxtase,
sentindo o mel e a manteiga derretidos deslizando garganta abaixo.
“Disse a você que era delicioso”, ele disse, a voz escoando com satisfação.
“Quase tão delicioso quanto saborear você”.
Os olhos dela se abriram de repente. “Você, senhor, é incrivelmente paquerador.
As pessoas não deveriam ter que ouvir esse tipo de coisa no café da manhã!”.
Ela piscou. Tinha acabado de repreender um homem em sua própria mesa. Ela olhou
de relance para ele sob as pestanas.
Ele pareceu divertido. “Tudo e qualquer coisa estão no cardápio aqui em Grange. Beijos antes
do café da manhã, flerte como um aperitivo”.
Ela se perguntou o que ele ofereceria como prato principal. E então ficou
chocada com o rumo de seus pensamentos.
“Cuidado, você está deixando cair mel no pulso”.
Ela pegou seu guardanapo de linho e enxugou o mel que tinha derramado sobre
a mão.
“Eu posso lamber e limpar para você—”
Ela deu a ele um olhar de advertência.
“Poderia como um gato, eu quis dizer”, ele disse com falsa inocência. “Você
gosta de gatos, lembra? Gatos, adoráveis criaturas sensuais”.
Lua decidiu que era mais prudente ficar interessada nas estampas das
cortinas. Ela desejou que não estivesse vermelha. Ela se sentia um pouco
quente.
Ele certamente era um homem que a incomodava.
Ele despejou um pouco mais de café para si e comeu uma pilha de torradas.
Ela esperou educadamente até que ele tivesse terminado, e no momento em que ele
terminou, disse, “Obrigada por sua hospitalidade e cuidado, mas nós realmente
devemos partir”.
“Fique mais alguns dias”.
“Obrigada, mas não é possível”.
“É perfeitamente possível. Fique e descanse. Há sombras escuras sob estes olhos
adoráveis”.
Lua tentou não ruborizar. “Minhas sombras não são da sua conta”, ela disse
com dignidade tranquila.
“Enquanto você estiver nas minhas terras e sob meu teto, são sim”.
“Estou deixando sua terra e seu teto”, ela o lembrou.
Ele franziu o cenho. “E aonde você planejar ir? Ontem à noite estava disposta
a chegar em Lulworth”.
Ela concordou com a cabeça. “Sim. O barco deveria nos ter levado direto até
a enseada de Lulworth, que é, pelo que sei, um excelente porto seguro, mas
quando chegamos aqui, o capitão simplesmente se recusou!”.
Ele encolheu os ombros. “Não é de se espantar, se você estava viajando com
contrabandistas”.
“Eles não eram contrabandistas. Eu nunca arriscaria meu filho perto de
contrabandistas!”.
Ele ergueu as sobrancelhas. “Não, claro que não, é por isso que eles te
deixaram na Baía Brandy”. Ele percebeu que ela não tinha entendido e acrescentou,
“Tem esse nome pela quantidade de conhaque francês contrabandeado que chegava lá
ao longo dos anos. Um lugar bem conhecido por contrabandistas”.
“Talvez, mas eles não estavam contrabandeando nada”.
“Exceto você e seu filho”.
Ela franziu o cenho, não gostou de pensar em si mesma e em Nicky como bens
contrabandeados. “Você pode pensar o que quiser. Um dos marinheiros me explicou
a verdadeira razão de eles não poderem entrar na enseada de Lulworth. Era
porque havia muitos preventivos no
porto”.
Ele deu uma gargalhada. “E o que você acha que são preventivos, minha linda inocente?”.
“Não me chame assim”, ela disse a ele. “Admito que não sei exatamente o que
é um preventivo é, mas imagino seja algo como um obstáculo, talvez uma criatura
grande e perigosa—”
Ele sorria amplamente. “Realmente é. Um preventivo é um oficial da lei, um empregado
que impede contrabandos”.
“Oh”.
“Sim, oh. Então, você não acha que está na hora de me dizer em qual tipo de
dificuldades está? Senhoras respeitáveis, casadas, ou até mesmo jovens com um
ano de viúvas, normalmente, não contratam contrabandistas”.
Lua mordeu o lábio. “Não, eu sinto muito, mas é melhor que você—é mais
seguro, quero dizer—não saiba nada sobre mim”.
Ele deu a ela um longo olhar. “Eu não sei de qual país você veio, mas está
um pouco confusa sobre como são as coisas aqui. As coisas ficam bem sérias quando
uma mulher e uma criança precisam ser protegidas por um homem crescido”.
Ele dobrou o guardanapo e o pôs de lado. “Então, quem é o amigo em
Lulworth?”.
Lua deu a ele um olhar aflito. “Não estou certa de que deveria dizer a você”.
Ele fez uma carranca. “Então, é um homem”.
Ela deu a ele um olhar indignado. “Não, certamente não é! Mel, a senhorita Melanie,
é minha antiga governanta”.
“Nesse caso, você definitivamente não vai”.
O queixo de Lua caiu o máximo que podia. “Realmente vou! Aonde vou, não tem
nada a ver com você”.
“Você é uma fugitiva e acredita que Nicky e você estão em perigo. Uma governanta
de idade avançada não poderá te proteger. Eu posso. Você vai permanecer aqui”.
A suposição tranquila de autoridade dele irritou-a. Toda sua vida ela tinha
recebido ordens, seus desejos sendo ignorados.
Ela pôs o próprio guardanapo de lado. “Obrigada, mas não”, ela disse
decisivamente. “Eu fiz meus planos e Mel está me esperando. Ninguém sabe que eu
estou indo para a Mel”.
“Exceto Mel, presumivelmente. Eu suponho que você tenha arranjado a visita através
de carta, certo?”.
Ela sabia o que ele estava implicando, mas ela não era tão ingênua quanto
ele supunha. “Sim, mas as cartas foram enviadas secretamente por um
intermediário”.
Ele pareceu cético. “Napoleão conseguiu parte de suas melhores informações através
de cartas enviadas secretamente por um intermediário”.
“Eu sei que era um risco, mas às vezes não se tem nenhum escol—”
“Exatamente! Você não tem nenhuma escolha. Você deve ficar aqui”. Ele se levantou.
“Eu enviarei uma mensagem para a senhorita Melanie—”
“Não, você não irá”. Lua estava ficando aborrecida. “É a minha vida e de meu
filho, e eu preciso fazer o que acho ser o melhor. Você tem sido muito gentil,
mas não pode me dizer o que devo ou o que não devo fazer. Eu só te conheci ontem
à noite; você não é nem meu pai nem meu marido. Você não tem nenhuma autoridade
sobre mim. Seria extremamente escandaloso se eu começasse a morar na casa de um
homem solteiro com o qual eu não tenho parentesco, e eu não farei isto”.
Ele se sentou de volta na cadeira e dobrou os braços, claramente descontente
com o resumo dela da situação. “Tolice! Você se esquece da Sra. Barrow. Ela daria
respeitabilidade à situação”.
“Uma cozinheira, por mais que seja amável e respeitável, não é suficiente”.
“Sim, mas ela também vai encher o lugar com criadas”. Ele colocou a cadeira
de volta debaixo da mesa e se moveu para ajudá-la a se erguer. “É a alternativa
mais sensata. Nicky ficará feliz em brincar com Jim, a Sra. Barrow está no sétimo
céu com dois meninos para alimentar e importunar. Você permanecerá aqui”.
“Não, eu—”
“Você está segura aqui”, ele acrescentou. “Você e Nicky. Ninguém sabe que
vocês estão aqui. E se descobrirem, eu posso proteger vocês”.
Ela engoliu em seco. “Não, você não sabe—”
“Eu não me importo com o que ou qual
seja o perigo. Eu sou—era—um soldado e posso pedir ajuda aos meus amigos, se for
necessário”. A voz dele aprofundou. “Eu prometo a você que posso e farei
resistência a qualquer coisa ou quem quer que seja que tenha assustado você e
Nicky. Você não está sozinha”.
Ela piscou enquanto os olhos enchiam com lágrimas súbitas. Tal generosidade
de um estranho… Quem era ele, este homem? Num minuto era paquerador e ultrajante,
e no próximo, um incrível protetor. E nem mesmo sabia quem ela era.
Isso era um problema. Ela não podia dizer a ele, porque se ele soubesse,
estaria em perigo, assim como todo mundo nesta casa. Pessoas já tinham morrido
por causa de Lua e seu filho. Ela não poderia suportar mais culpa.
Tinha sido contra seu melhor julgamento ir para Mel, mas Mel tinha escrito
que sabia dos riscos e que nunca perdoaria Lua se ela não fosse até ela. Mel a conhecera
e a amara desde que ela era uma criança, a coisa mais íntima que Lua tinha agora
como família.
E Mel precisava dela. Mel era só, também. E para Lua sentir a necessidade
dela… ela não conseguia se lembrar de quando alguém, além de Nicky, tinha precisado
dela para qualquer coisa.
“Claro”, ele acrescentou em um tom de voz diferente. “Eu deveria esperar
que você me protegesse em retorno”.
“O quê?”, o queixo de Lua caiu. “Proteger do quê?”.
“Da ira da Sra. Barrow quando ela descobrir que dei ao meu cachorro um
pouco de rim debaixo da mesa”.
Ela não pôde evitar sorrir. “Não, você é muito gentil, e estou agradecida,
mas não posso abusar ainda mais da sua hospitalidade. Ninguém saberá que eu ficarei
em Lulworth, e Mel está me esperando. Nicky e eu partiremos assim que for conveniente”.
Ele cerrou a mandíbula. “Eu poderia te forçar a ficar”.
Ela encontrou o olhar dele honestamente. “Mas você não irá”.
“Não”, ele rosnou. “Entretanto é contra o que acho certo. Eu te escoltarei até
essa Mel, mas você não me verá pela última vez, estou avisando!”.
“Isso é uma ameaça?”, ela disse friamente.
Os olhos dele de repente se aqueceram. “Não, uma promessa”.
Recadinho: Gente hoje só vou poder postar esse cap. Irei passar a arde fora de casa! Bom espero que entendam!Amanhã divulgarei os dois nomes das pessoas que vão entrar no blog!Beijos!
Ameiiiiiii, posta mais!!!!!!!!!
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