Parte 2
“Castanho!”, ele disse, soando satisfeito. Ele terminou de arrumar o pavio
e deu um passo para trás.
Ela franziu o cenho. “Desculpe, não entendi”.
“Eu estava me perguntando qual seria a cor deles desde que te encontrei”.
“Que cor é o quê?”.
“Seus olhos. Eles são castanhos”.
Ela piscou e não tinha ideia do que dizer.
Nicky voltou com uma pilha enorme de toalhas, e o Sr. Aguiar encheu uma bacia
grande com água quente. Ele se ajoelhou e colocou um pé de Lua nela, então tirou
o chinelo restante dela.
“O que está fazendo?”, ela perguntou surpresa.
“Seus pés estão horríveis. Estão todos cortados; você não notou?”.
Lua olhou. Os dedos do pé estavam cortados, arranhados, sangrando e barrentos.
Eles realmente estavam horríveis. Ela quase não tinha notado. Seus pés tinham
estado tão frios, e apesar de que ela estivesse ciente de algum desconforto,
outras coisas mais urgentes ocupavam sua atenção.
“Deve ter acontecido quando estávamos vindo da praia. Lembro de ter batido
algumas vezes meus dedos nas pedras e conchas”. E agora que ela pensava nisso, tinha
doído.
“Aqui, ponha-os na água. Cuidado, está quente e salgada, deve arder, mas
ajudará os cortes a se curarem”.
Cuidadosamente ela colocou os pés na água quente. Queimou no princípio; os
pés estavam meio congelados, e os cortes arderam, mas algum tempo depois pareceu
divino.
Ela encostou-se à cadeira, banhada pelo calor e o conforto, secando o
próprio cabelo e o de Nicky com uma toalha seca.
“Melhor?”, Arthur Aguiar perguntou depois de um tempo.
“Sim, obrigada. É adorável”, ela disse agradecida.
“Bom”. Ele sorriu. Seus dentes eram brancos e uniformes. “Agora, vou
colocar um pouco de pomada nos cortes. A Sra. Barrow faz uma pomada excelente
para cortes e arranhados”.
A boca de Lua se abriu, para reagir, quando ele começou a secar os pés dela
com uma toalha.
“Eu—eu posso fazer isto”, ela gaguejou. Era muito perturbadora a sensação
das mãos mornas e grandes dele acariciando os pés dela tão suavemente com a
toalha.
Ele sorriu novamente. “Eu sei, mas não me importo de fazer isto. Pode buscar
mais duas toalhas para mim, Nicky, por favor”. O filho dela saiu e um par de
olhos azuis sinceros encontrou os olhos dela.
“Eu não creio que isto seja muito adequado”, ela murmurou.
“Você não gosta?”.
Ela deu a ele um olhar aflito. Sim, ela gostava. Claro que gostava. E essa era
a questão. Ela nem a conhecia e ele não deveria tocar os pés dela com tanta intimidade.
Fazia com que ela… sentisse coisas, coisas que não deveria sentir por um
estranho.
Quando ele estava secando o último dedo do pé dela, ela disse, “Obrigada.
Você pode soltar meus pés agora”.
Ele não deu atenção. Tirando do pote um pouco de pomada aromática com os
dedos, ele continuou esfregando os pés dela com as mãos, lentamente,
suavemente, em um ritmo sensual. Os dedos do pé dela se enrolaram com prazer e
ela sentiu formigamentos de prazer por toda a perna.
Ela piscou, dividida entre o prazer e o embaraço. Ele estava apenas
cuidando das feridas dela, ela se lembrou, mas mesmo tentando, não conseguia parar
de reagir, embora soubesse que não deveria.
“Por favor, já é o suficiente”, ela disse. “Você não me ouviu pedindo que
soltasse os meus pés?”.
“Oh, soltasse—eu pensei que você tivesse
dito tocasse”, ele explicou, olhando para
ela com um cintilar. “Entendi que queria que a tocasse”.
O queixo dela caiu. Ele sabia o
que o toque dele estava fazendo nela. Ele estava flertando com ela.
A realização a surpreendeu. Nenhum homem tinha flertado com ela desde…
nunca. Ela deixou de ser criança para ser a esposa de Rupert. Ninguém ousaria flertar
com a esposa de Rupert. Ela não tinha nenhuma ideia do que fazer.
Ela disse fracamente, “isto é uma descarada l—tolice!”, ela empacou ao chamar
um homem de mentiroso em sua própria casa.
“Oh, massagem não é uma l—tolice”. A voz dele era séria, mas os olhos azuis
dançavam. “É muito útil. Ajuda muito os soldados, previne ulcerações ou
frieiras. E é maravilhoso para pés cansados, você não acha?”.
“Eu não queria dizer—”
“É em francês que se diz le ‘tolice',
nós dizemos apenas ‘tolice”. Os olhos dele cintilaram. Ele sabia muito bem o
que ela iria dizer.
Era tão ridículo que ela não conseguiu evitar ri. “Eu sei perfeitamente como
se diz. Eu nasci aqui!”.
“Nasceu? Que coincidência, eu também, então nós já temos algo em comum. E Nicky também
nasceu aqui?”.
“Não”, Nicky interrompeu a conversa quando retornava com as toalhas. “Eu nasci
em—”
“Não, Nicky não nasceu aqui!”, ela deu ao filho um olhar de advertência.
Ninguém, nem mesmo homens altos e inesperadamente amáveis que flertavam com ela
deveriam saber quem eles eram. “E, por favor, senhor, meus pés ficarão muito
bem agora, obrigada”.
“Quando a pomada for absorvida”. A voz profunda dele era completamente
imperturbável. Os dedos longos e fortes continuavam a fazer a massagem. Ele
acariciou cada dedo do pé dele, roçando entre eles e enviando minúsculos
arrepios invisíveis e excitantes subindo pelos membros dela. Sentia que os
ossos estavam virando geleia.
Era completamente impróprio e totalmente divino, e tudo que Lua não podia
fazer era se dissolver em uma poça de felicidade.
Ela observou o rosto dele enquanto ele cuidava dela, notando sua força
quieta, as linhas fundas ao redor da boca, e a aparência desolada que surgia em
seus olhos quando ele não se lembrava de flertar. Era de repente tão íntimo.
Lua fechou os olhos…
Thur foi buscar uma torta na despensa. A Sra. Barrow tinha feito várias
antes de partir para visitar a mãe.
“Eu aposto que você está com fome, não é, Nicky?”, ele cortou uma fatia de
torta e a deu para o menino. “Coma tudo, rapaz. É torta de porco; eu garanto”.
Nicky hesitou e olhou de relance para a mãe. “Mamãe nunca come porco”, ele
disse. “Papai diz que—diz que é vulgar as senhoras comerem porcos”.
“Entendo”, Thur murmurou, notando uma mudança tensa. Papai soava meio estúpido.
O menino olhou de relance para a mãe, que estava dormindo a três quartos de
hora. “Deixe-a assim”, Thur disse suavemente. “Ela está muito cansada. Apenas coma
a torta e então todos nós iremos dormir”.
Nicky olhava duvidosamente para a fatia de torta. Ele não fez nenhum
movimento para tocá-la.
“Você não gosta de porco, também?”, Thur perguntou. “Bem, então, se você
não quer”. Ele pegou-a e mastigou.
O menino observou. “Eu não disse que não queria”, ele disse depois que Thur
tinha engolido o último bocado. “Estou faminto”.
“Certo, então corte você mesmo outra fatia enquanto trago algo morno para
você beber”.
Nicky cortou uma pequena fatia e deu uma mordida cautelosa na torta. Seus
olhos se arregalaram. “É muito bom”.
“Disse a você que era”, Thur disse a ele. Ele voltou para a despensa e
despejou um pouco de leite em uma panela. Quando ele retornou para Nicky ele estava
terminando sua fatia de torta com evidente satisfação. Thur tinha aquecido o
leite, despejado um pouco em uma xícara, colocado um pouco de mel e o entregou
ao menino.
O menino olhava fixamente para ele como se a xícara tivesse uma serpente
viva.
Thur disse com suave exasperação. “É algum costume estrangeiro seu, recusar
comida e bebida que é oferecida a você? Aqui é polido aceitar da primeira vez, então
apenas beba o leite e não faz um rebuliço”.
O pequeno menino ficou branco. “Mamãe!”, veio um gemido baixo e assustado.
A mãe dele despertou e viu Thur dando a xícara de leite para o menino, ela saltou
então da cadeira, e deu um tapa na mão de Thur. O leite espirrou no chão de
pedra. Ela empurrou Nicky para trás dela, olhou de relance ao redor, viu a faca
que tinha sido usado para cortar a torta, e a pegou.
“O que diabos—”, Thur começou.
“Não toque nele!”, ela estava pronta para ação; uma jovem leoa em defesa de
seu filhote. “Nicky, você bebeu?”.
“Não, mamãe”. Ela se vergou com alívio visível.
“Era apenas leite morno”, Thur disse firmemente. Ele se curvou e ergueu a
xícara.
Ela acenou a faca contra ele. “Fique para trás”.
Ele a ignorou e foi para a porta, abriu-a e assobiou. A cadela dele, Juno, entrou
com o rabo sacudindo de alegria. “Ali”, ele disse e apontou para o leite com mel
derramado.
“Não!”, o menino ofegou e se moveu para se posicionar entre o leite e a cadela.
Ela sacudiu o rabo brevemente—porque Juno gostava de crianças—mas a comida
era sempre uma prioridade, e passou por ele e feliz começou a lamber o leite. A
mulher e o menino olhavam fixamente para Thur como se ele fosse um monstro.
Thur foi buscar outra xícara da cômoda e depois a panela pequena no fogão e
despejou leite quente em outra xícara. Dois pares de olhos o observavam.
“Ele pôs algo nisto antes”, Nicky disse a mãe.
“Desse pote, sim”, Thur afirmou e mexeu uma colher no líquido viscoso. “É
mel. Leite e mel mornos. É bom para ajudar as pessoas a dormirem”. Ele bebeu da
xícara e então a estendeu na direção de Nicky.
Houve um longo momento de silêncio. Juno tinha lambido cada gota de leite
do chão e tinha descoberto um ou dois farelos da casca da torta, e agora estava
pronta para renovar sua amizade com o menino. Ela cutucou o cotovelo dele de maneira
amigável, exigindo ser acariciada. Ele acariciou as orelhas sedosas dela, sentiu
seu nariz gelado, e olhou cuidadosamente dentro dos olhos dela. O rabo dela
deslizava alegremente no chão com a atenção recebida.
O menino e a mulher olhavam do cachorro para o homem e então para a xícara
de leite e para o cachorro novamente. “Às vezes é necessário dar um voto de
confiança às pessoas”, Thur disse tranquilamente e colocou a xícara na mesa.
“Se eu quisesse machucar um dos dois, poderia tê-los jogados daquele precipício
e teria me poupado muita dificuldade”.
Por muito tempo ninguém se moveu. Lua tentou ler os olhos dele. Estavam
firmes e azuis, muito azuis. Mas não se pode decidir se um homem é digno de
confiança só porque ele tem olhos azuis. Mesmo que fossem sinceros e azuis ao
mesmo tempo…
Ela olhou fixamente para os olhos dele e se lembrou de quando ele a tinha puxado
do topo do precipício. Ela pensou no modo como ele a tinha segurado no cavalo, firme
e quente, dobrando o casaco ao redor dela para abrigá-la da chuva.
Então, olhando fixamente para os olhos azuis, os mais azuis que ela já vira,
Lua ergueu a xícara de leite e tomou um bocado. Tinha gosto de leite e mel
mornos. Nada mais. Exatamente como ele havia dito. Ela o saboreou novamente, só
para ter certeza.
O cachorro cutucou o braço de Nicky, o rabo macio suavemente acenando, os olhos
marrons brilhantes, claros e confiantes. E ilesos.
Lentamente a tensão saiu de Lua. Ela concordou com a cabeça, passou a
xícara para Nicky, colocou a faca de volta na mesa, e retornou para a cadeira,
sentindo-se cambaleante.
Nicky tomou um gole cauteloso do leite. Enquanto isso, o cachorro foi
buscar uma vara na cesta perto do fogo e a colocou esperançosamente aos pés de
Nicky.
“Não, Juno, nenhuma vara será jogada do lado de dentro”, o dono dela disse.
“Ponha lá de volta”. Para o assombro de Nicky, com o rabo arriado, a cadela pôs
a vara de volta na cesta, então voltou a esfregar um focinho triste contra a perna
de Nicky. Nicky rapidamente bebeu o conteúdo da xícara, sentou no tapete, e
começou a acariciar a cadela.
“Você quer leite, também?”, Sr. Aguiar perguntou a ela.
Lua agitou a cabeça. “Não, obrigada”. Ela fechou os olhos. Tinha náuseas. O
incidente com o leite tinha trazido tudo de volta. Ela não podia relaxar a vigilância.
“A Sra. Barrow trouxe algumas roupas secas”, ela ouviu Sr. Aguiar dizer
pouco tempo mais tarde. Pelo menos ela pensou que tivesse sido pouco tempo. Os
olhos de Lua se abriram de repente. Onde estava Nicky? Ela não podia ter
cochilado novamente, podia?
“Ele está adormecido”, disse o homem, lendo os pensamentos dela.
O filho dela estava enrolado no tapete com o cachorro grande, com pelo preto
e castanho amarelado, dormindo profundamente. Os braços dele estavam em torno
do cachorro, e o focinho do cachorro descansava sobre o ombro de Nicky.
Lua sentiu um nó na garganta, pensando no filhote que ele tinha perdido.
“Todo esgotado, o pobre menino!”, a Sra. Barrow disse. “Leve-o para a cama,
Sr. Thur, enquanto eu ajudo a senhorita a se trocar”.
Sr. Thur se curvou e pegou Nicky em seus braços. O cachorro ficou de pé,
claramente pretendendo ir com eles.
Lua se ergueu.
“Não, não venha”, ele disse. “Ele está dormindo como um bebê e enquanto eu o
levo você poderá colocar as roupas secas que estão na frente do fogo”.
Lua olhou para o filho que dormia e engoliu em seco. Ele parecia tão
pequeno e impotente nos braços de um homem alto. E tão vulnerável. Ele nem se mexeu
quando o Sr. Aguiar abriu a porta com um empurrão da bota.
Uma ideia suspeita passou subitamente por ela. Dormindo como um bebê—ou drogado? Alguns venenos eram insípidos.
Era por isso que ela tinha adormecido? Oh Deus, como ela poderia ter confiado, mesmo
que por apenas alguns momentos, o seu precioso Nicky—apenas por causa dos olhos
dele? Ela foi até ele, para pará-los.
Gente, comentem please *---* Gente, nessa fic a cor dos olhos do Arthur é Azul u.u kkkkkkk

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